quinta-feira, setembro 30, 2010

Mais vale ficar calado...


Nunca simpatizei particularmente com Ramalho Eanes, general, líder de facto do Grupo dos 9 (grupo de militares que dizia "recusar tanto o modelo socialista da Europa de Leste como o modelo social-democrata da Europa Ocidental, apresentando um projecto socialista alternativo", que mais não seria que um estender de passadeira vermelha à oligarquia e às ditas elites para governarem o país em seu próprio proveito, aumentando continuamente os, já de si enormes, desníveis sociais), presidente da república (1976-1986), mentor e presidente do PRD (partido fundado com o objectivo de "moralizar a vida política nacional" e que acabou vendido a um grupo de extrema-direita).

O facto de ter tido o seu irmão como professor no primeiro ano da universidade contribuiu ainda mais para essa aversão. O tipo era terrivelmente entendiante, a matéria da cadeira não interessava nem ao menino Jesus e as aulas eram à sexta-feira de manhã... Para além disso o indivíduo fazia questão de tratar putos de 18-20 anos por engenheiros, passando grande parte do tempo da aula a ditar apontamentos em alta velocidade. Ora, eu que sempre tive enorme orgulho na minha caligrafia quase perfeita, ficava profundamente desolado ao olhar o caderno no final da aula...

De facto, a única parte que apreciava na aula era quando o tipo se metia a divagar, contando histórias, algumas delas verdadeiramente hilariantes. Retive particularmente uma das mesmas, quando relembrou a campanha eleitoral para as Presidenciais de 1976, mais concretamente uma visita a Portel em que os "sacanas" dos comunistas alentejanos quase agrediram a comitiva do candidato. Aqui entre nós, diria que foi uma pena tal não ter acontecido...

Esta semana, o general Ramalho Eanes voltou a estar em evidência e, pasme-se, pela positiva ao declarar que: "Há tanto ruído desnecessário e desadequado à volta das questões politicas, que seria pouco razoável que eu aumentasse esse ruído com observações minhas." respondendo ao pedido dos jornalistas de um comentário sobre as questões orçamentais.

Tenho ouvido comentários de imensos energúmenos ávidos de sangue, leia-se desejosos de (ainda) mais medidas de austeridade contra os trabalhadores e o povo em geral, que sou obrigado de imediato a relembrar que a esmagadora maioria desses mesmos energúmenos tiveram responsabilidades governativas na área das finanças e economia, logo têm imensas culpas no estado caótico a que o país chegou. Pelo menos, Ramalho Eanes teve a sensatez e clarividência de ficar calado, como que tentando passar incólume por entre os pingos de chuva... 


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