terça-feira, novembro 15, 2011

A carta que nunca te escrevi

Deve estar a fazer 10 anos. Estava um dia frio e triste, tipicamente de Outono. Nada melhor para o alegrar do que oferecer-te um ramo de rosas vermelhas. 24. Nunca soube porque escolhi esse número, acho que foi o primeiro em que pensei. Pareceu-me bem. Redondo. Como eu era ingénuo e apaixonado. Pensei que iríamos viver felizes para sempre depois desse momento especial. Foi-o de facto, pelo menos por breves instantes. E certamente inesquecível.
Cheguei primeiro ao nosso sítio. O nosso banco, no nosso jardim. Tremia ligeiramente e não era apenas do frio. Estava nervoso. Mal podia esperar para que chegasses. E passado pouco tempo lá surgiste ao fundo. Não disfarcei o sobressalto, mas tentei esconder o ramo, colocado estrategicamente a meu lado para poder sentir a tua reacção o mais próximo possível quando te deparasses com a surpresa. A tal surpresa que anunciei desajeitadamente por mensagem e te fazia apressar o passo. Apesar da ansiedade que te recortava o rosto, trazias igualmente o sorriso pelo qual me enamorei. Trémulo, mas estava lá. E quando a surpresa deixou de o ser, a tua pálida face abriu-se num enorme e belo sorriso que me fez disparar a pulsação vertiginosamente. Por momentos julguei ter conseguido, mas a felicidade foi momentânea. O choro compulsivo que atravessou a perfeição revelou-me de imediato que seria impossível. Nunca acreditei no destino, mas nesse momento tive a terrível sensação que nada mais por nós havia a fazer. Estava escrito algures que os nossos caminhos se cruzavam apenas por algum tempo. Mais tarde ou mais cedo uma qualquer encruzilhada confirmaria o inevitável. Apesar disso não desisti. Lutei muito e durante muito tempo contra isso. Recusava-me terminantemente a aceitar. O silêncio corrói, sufoca e sinto que é altura de o desmascarar.
Tentei dar-te os parabéns pelo noivado. Não consegui. Tentei desejar-te as maiores felicidades pelo casamento, mas ainda foi pior a emenda que o soneto. Algo mais forte o impedia. Talvez a teimosia. A simples ideia de te perder para sempre era demasiado aterradora. E continuei na zona de conforto à qual chamo silêncio. Parece um paradoxo classificar o silêncio como corrosivo, sufocante e confortável ao mesmo tempo. No entanto, é apenas e somente caracterizado por possuir várias faces, distintas ou não entre si. Tal e qual como o teu sorriso extasiante ao qual se adicionaram lágrimas. Lágrimas de impotência, presumo. Continuo a acreditar e a sentir que assim seriam. E só quando percebi o funcionamento do silêncio concluí que já te tinha perdido há muito tempo. 10 anos para ser exacto. Naquela tarde fria de Outono, naquele banco de jardim.

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